ÀG.’. D.’. G.’.A.’.D.’.U.’.
Nietzsche:
Sobre
a verdade e a mentira no sentido extra-moral
De espírito crítico e insaciável, o filosofo de Rockën ( na Alemanha),
Friedrich W. Nietzsche ( 1844-1900), assume a tarefa de refletir sobre o conceito
de verdade e seu fundamento; a natureza da linguagem, suas funções, seus
limites e sua relação com a verdade e a mentira. É uma tarefa um tanto ousada,
considerando-se que o filosofo alemão para tanto, terá ate mesmo de desafiar e
por em xeque muito do que foi posto pela filosófica ate então, abordando este
tema de maneira inovadora e original. Nietzsche inicia sua investigação
questionando o estatuto da verdade, a fim de que a verdade, ao se auto
questionar, possa assim revelar alguma não-verdade, manifestando por meio deste
viés, algo intrigante a respeito de si mesma.
Para Nietzsche, a filosofia desde os primórdios, não escapou do equivoco
de acreditar que a forma fundamental do pensamento correspondesse com exatidão,
as palavras que são expressas, e portanto, teria se interessado mais pela dimensão
apofântica da linguagem, ou seja, os enunciados verbais passíveis de serem
falsos ou verdadeiros, e isto, em virtude de descreverem corretamente ou não o
mundo.
Porem, no que tange natureza da verdade de tais enunciados, Nietzsche
apresenta-nos a possibilidade de que, esta verdade dos enunciados, possa de
fato, se tratar de uma espécie de engano necessário a sobrevivência do homem.
Supondo que a verdade e a mentira possam estar na mesma condição, o filosofo
alemão busca com isto, revelar o caráter dissimulador do intelecto humano, e a
partir disto, tornar evidente,sua suspeita de que entre o ‘refletir’ e o
‘dizer’ não vigora nenhuma identidade estrutural.
Neste opúsculo, Nietzsche se propõe a analisar de forma critica a fragilidade
do intelecto humano, quando da construção e aprimoramento do conhecimento. Essa
fragilidade segundo ele, ocorre devido ao fato de que a atividade intelectual
estar sempre suscetível as influências das convenções forjadas pela
coletividade, pela imposição do mais forte. Essa adesão do sujeito à sociedade
segundo ele, contaminaria e automatizaria o intelecto, levando-o a optar por
‘noções aptas’ a garantir a sua sobrevivência, impelindo-o a “produzir
falsificações”.
A nossa atividade intelectual estaria comprometida e, por conseguinte
submissa a modelos lingüísticos cristalizados, repleto de simplificações e
abstrações arbitrarias, que acabam por não nos fazer perceber, o efeito
dissimulador da linguagem. Com isso, o filosofo chama-nos a atenção, no que
tange a questão da natureza das palavras. O que seriam as palavras para
Nietzsche?:
” De
antemão, um estimulo nervoso transposto em uma imagem! Primeira metáfora! A imagem
por seu turno, remodelada num som! Segunda metáfora.”( NIETZCHE,2012,p.31)
Quanto ao processo de formação da
palavra, seria este de caráter duplo, abarcando a seguinte transposição: uma
excitação nervosa convertida numa imagem mental; engendraria por sua vez, a
transposição de tal imagem, num som articulado.
Nietzsche, corrobora insistentemente sua tentativa de revelar a
limitação e falibilidade das palavras, ao afirmar que, em virtude da palavra
ter sido criada com vistas a exprimir uma sensação subjetiva, ela se restringe
apenas “ as relações entre as coisas as quais nos referimos e a nos mesmos,
e portanto nunca se referem as coisas em
si mesmas. Por isso, essa arrogância que adquirimos através dessa “consciência
orgulhosa e enganadora”, se dissipa quanto constatamos que “[...] nada possuímos
senão metáforas das coisas que não correspondem em absoluto,
as essencialidades originais.”(NIETZCHE,2012,p.33)
No trato constante com as palavras, o homem
tende a querer encontrar correlatos para as palavras que veicula, e assim
abrevia aquilo que se lhe apresenta, levado pelos sabores das circunstancias,
que mais se enquadram em seus interesses. A verdade fica relegada ao segundo
plano e o que prevalece neste caso é uma escolha motivada pelo interesse, que
se vale da linguagem como recurso, devido ao seu caráter nivelador, que através
da igualação do não-igual, atribui valor as coisas. Isto ocorre durante o processo
de formação de conceito e linguagem.
Com isto, Nietzsche quer chamar a atenção a outro aspecto da linguagem,
no tocante as palavras e os conceitos que elas designam; através da relação do
homem com o mundo, de acordo com seus interesses, suas necessidades, contingenciais
e circunstancialidades, a linguagem adquire um caráter móvel e variável, que se
estende no tempo e no espaço, subsidiando o potencial criador do homem por
intermédio desses recursos que a linguagem proporciona, ou seja, aquilo que
Nietzsche irá chamar de:
“[...]exercito
móvel de metáforas , metonímias ,antropomorfismos, numa palavra, uma soma de
relações humanas que foram realçadas poética e retoricamente.”( NIETZSHE,2012,p.36).
No entender de Nietzsche, a verdade que as palavras podem nos fornecer
seria fruto da engenhosidade humana, que se utiliza das palavras para a construção de
conceito e linguagem, e por isso, através das palavras, o homem apenas
reencontraria aquilo que ele mesmo teria posto nelas. Daí a metáfora que Nietzsche
se utiliza para exemplificar a natureza da verdade contida nas palavras: quando
alguém esconde algo atrás do arbusto, volta a procura-lo lá onde o escondeu e
além de tudo o encontra, não há muito do que se vangloriar nesse procurar e
encontrar”.( NIETZSCHE,2012,p.39)
Nietzsche por último, faz referencia a uma espécie de representação
anterior a palavra articulada, que se manifestaria como uma espécie de metáfora
intuitiva, e poderia ser definida como “uma ancestral remota e fugidia do
próprio conceito”, como alternativa de superação da trama das ficções que o próprio
homem criou para si; que o levaria a reencontrar assim, não mais a presença
imediata das coisas em si mesmas, e sim aquilo que há de mais “inexplorado” na
palavra.
Desse modo, como clara imitação da compreensão do homem acerca da
linguagem, a ‘metáfora intuitiva’ surge, senão como a mãe, pelo menos enquanto
a mãe da mãe de toda representação conceitual. Em outras palavras, o filósofo
alemão propõe a mediação do mito e da arte como forma de superar tais impasses
e conduzir a vida de forma plena, viva e autêntica. Isto é, tornando-se senhor
de si mesmo através do domínio da arte sobre a vida.
Em suma, poderia se dizer que:
para Nietzsche verdade e mentira não são polos tão opostos quanto parece, mas
que podem ser a mesma coisa, o que vai diferenciar a mentira da verdade e
vice-versa é a moral, ou o valor moral que as fundamentam, de acordo com a
ocasião. Esses valores morais seriam valores criados a partir da visão da
classe dominante, uma elite burguesa que institui valores e os impõem sobre os
“mais fracos”, a sociedade gregária contemporânea. Para ser aceito no grupo
social, o homem já nasce predisposto a adotar os valores que substanciam a verdade
imposta “pelos mais fortes” sobre os mais fracos.
Em Nietzsche, a essência da
linguagem é na realidade um jogo da mente criativa do homem, que transpõem estimulo
nervoso em conceito articulado por som, na tentativa de referir-se a alguma
coisa no sentido de captar a sua essência, mas na verdade ele apenas atribui
nome, restrito a um significado subjetivo, que atingi uma universalidade e se
cristaliza na sociedade por meio da imposição. Por isso, o filosofo alemão
tenta esclarecer que a verdade humana é uma quimera, uma ilusão, um meio que o
homem encontrou pra garantir a própria sobrevivência dentro do âmbito da
convenção social.
Para Nietzsche, a arte e o meio
mais próprio e autentico de expressar a essência das coisas, devido ao caráter
originário da arte, que vai além da linguagem servil de natureza metafisica,
transpondo os limites da gramatica através de imagens, sons, expressões
corporais e emanações de estados de espirito inconceituáveis e indetermináveis
através das palavras, porque são expressões da vida em seu caráter peculiar, em
seu modo próprio, enquanto abertura de experiências singulares e tão ricas, que
a palavra e conceito falham ao tentar mensurar, tão plenas que, dentro do campo
da experiência humana no mundo, é possível dar-se dentro de uma única
existência, infinitas formas de existência. Isto implica dizer que, homem enquanto
obra de arte de si mesmo, é um ser reticente, que esta sempre aberto, sempre
projetando-se para fora de si mesmo, e experimentando o mundo de modos
infinitamente diversos, sempre há criar novas formas de existir em uma única e
singular existencia.
Referencias:
NIETZSCHE,
Friedrich Wilhelm. Sobre Verdade e Mentira no Sentido Extra-Moral. (Org. e
Trad. Fernando de Moraes Barros). São Paulo: Hedra, 2007.
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